Educação

Fábrica de sonhos: Cursinho preparatório da UFRN contribui para a aprovação de alunos da rede pública no Enem

Por: Adriane Galvão e Hellen Almeida – Extensão.com – Agecom/UFRN
Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN

O educador Paulo Freire em seus estudos pontua que a educação sozinha não transforma a sociedade, mas sem ela tampouco a sociedade muda. A história de Jainy Costa, estudante de Letras – Língua Portuguesa da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), foi moldada por essa perspectiva. Jainy, que mora em São Gonçalo do Amarante, foi criada por avós analfabetos e descobriu desde cedo que a educação poderia transformar o seu mundo. Durante toda a sua vida, foi aluna de escola pública e em 2017 começou sua trajetória de realizações dentro da Universidade como aluna do Programa Complementar de Estudos do Ensino Médio (Proceem/UFRN). O desejo era passar no exame que lhe daria a oportunidade de iniciar uma graduação dentro da Universidade. 

Jainy sabia que seria por meio daquelas salas de aula que seus sonhos começariam a se concretizar. Atualmente, ela está no 8º período de Letras – Língua Portuguesa e atua como bolsista no Proceem, inspirada pelos seus professores da época do cursinho. A estudante busca ajudar outros jovens da rede pública de ensino a aprenderem que a educação é a chave para mudar a sociedade. 

Enquanto ainda era aluna do cursinho preparatório, Jainy ficou encantada com o formato de ensino oferecido, com contato próximo que tinha com os professores e as relações afetivas que criou com outros alunos do Proceem que também tinham o objetivo de ingressar no ensino superior. O cursinho foi uma experiência que marcou a sua vida como estudante, ao ponto de brotar em seu coração o desejo de um dia retornar para o projeto como bolsista e passar todos os conhecimentos adquiridos na graduação para outros jovens. 

“Desde que eu era aluna, já tinha vontade de voltar um dia como bolsista. Estar concretizando isso pra mim é uma realização pessoal imensa, me sinto muito feliz por ter conquistado meu objetivo na época de aluna do Proceem que era ingressar na universidade e agora poder retornar para o projeto como bolsista. Ser um agente na realização do sonho de outras pessoas, mesmo que a gente não tenha nem dimensão de quais são eles, acabamos viabilizando esses sonhos.”

Assim como aconteceu com Jainy, o Proceem continua contribuindo para formação de outros jovens que também estão em busca da tão sonhada aprovação no Enem. Gleybson Almeida, morador de Parnamirim, terminou o ensino médio em 2021, não conseguiu ingressar no ensino superior, mas viu dentro do Proceem a oportunidade de crescer dentro da Universidade, estudar e se preparar para chegar aonde quer. 

O estudante de 18 anos acredita que a educação de qualidade é algo que todo mundo deveria ter acesso “e se tem uma maneira de conseguir isso, de uma maneira acessível para a maioria dos alunos de escola pública do Rio Grande do Norte, é o Proceem. E o que mais me estimula a estar aqui é saber que eu vou ter a chance de realizar os meus sonhos, aqui eu vou ter chance de fazer o que eu quero e de ser quem eu quero ser”, afirma. 

Outro aluno que está cursando o Proceem em 2022 é Lucas Batista, morador de Monte Alegre, que queria fazer concurso militar, mas foi incentivado pelos primos para prestar o Enem. “Meus primos falaram do cursinho, pois já haviam participado. Eu me inscrevi, consegui a vaga e agora já estou estudando para fazer o curso de Ciências Contábeis”, revela. O Proceem abriu um novo leque de possibilidades para Lucas, que mora com os avós desde que completou um ano de idade, e pensa em se formar e ter um bom emprego para dar uma vida melhor para os avós.

Pandemia

Durante a pandemia do Covid-19, diversas escolas públicas no Brasil foram prejudicadas pela falta de estrutura para atender os alunos, principalmente aqueles que estavam se preparando para o Enem. Na visão de Gleybson, o Proceem é uma maneira auxiliar a mudar isso e trazer mais alunos da escola pública para dentro da Universidade, assim como dar mais oportunidades para os estudantes que não têm condições financeiras para pagar um cursinho particular. 

Em 2021, mesmo com as dificuldades impostas pelo ensino remoto, dos 112 alunos inscritos no Proceem, cerca de 88 alunos foram aprovados na UFRN. “Um percentual bastante significativo se olharmos para a precariedade do ensino público durante a pandemia”, explica a coordenadora adjunta do cursinho, Jucimar Villar. Segundo dados da coordenação, nos últimos nove anos, o cursinho contribuiu, ao total, para a aprovação de 1.267 alunos. 

Em 2004, a Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) e a Pró-Reitoria de Extensão (Proex) desenvolveram o Proceem para auxiliar na preparação escolar de alunos de escola pública de Natal que iriam ao final do ano fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). No início, a Secretaria da Educação determinava quais escolas seriam atendidas pelo projeto, então a UFRN tinha a missão de selecionar os bolsistas para ministrar as aulas e auxiliar no deslocamento para essas escolas. 

A partir de 2011, as aulas preparatórias começaram a ser ministradas dentro do Campus da UFRN, como uma forma de melhorar as condições de ensino, motivar os alunos a ingressarem na Universidade e ofertar mais vagas – possibilitando a expansão do atendimento para alunos do interior do estado. Durante os 18 anos do projeto, o cursinho contribuiu para que diversos estudantes das escolas públicas do estado realizassem seus inúmeros sonhos por meio da educação. 

Atualmente, o programa contribui para a formação escolar dos estudantes de Natal, Santa Cruz, Caicó e Currais Novos, com o objetivo de preparar estudantes para a vida acadêmica no ensino superior, superando as barreiras que dificultam o êxito no Enem. Também auxilia com a formação dos discentes de licenciatura, oferecendo espaços para exercerem a iniciação à docência e desenvolverem pesquisas nos campos do ensino e da coordenação pedagógica/gestão escolar que possibilitem o avanço das ciências ligadas às práticas educacionais. 

Maycon Gomes, estudante do último período da licenciatura em Matemática, também foi aluno do Proceem em 2017. Durante dois anos ministrou aulas no Proceem e atualmente está no mercado de trabalho como professor de matemática. “Fui aluno da escola pública e sempre vinha aquele pensamento ‘será que eu vou conseguir, realmente, ingressar na universidade? será que vai dar certo?’ Eu consegui chegar até aqui, sou a prova de que a educação de qualidade existe e o conselho que eu deixo para os alunos do Proceem é que estudem, não desistam dos seus sonhos que tudo vai dar certo”, ressalta o estudante. 

Retorno ao presencial

Em 2022, foram selecionados 206 alunos, de 844 candidatos inscritos. Diante da alta demanda de alunos interessados em participar do Proceem, a coordenação do programa está trabalhando para ampliar o número de alunos atendidos, com a possibilidade de conseguir novos bolsistas para possibilitar a abertura de novas turmas. Jucimar Vilar ressalta que a intenção da coordenação em ofertar mais vagas é para que, assim, mais jovens tenham a oportunidade de ingressarem no ensino superior. Antes da pandemia, o projeto atendia uma quantidade maior de alunos distribuídos em 3 turnos. Neste ano, as aulas são ministradas nos turnos da manhã e noite.

O projeto tem como coordenadora a professora Jussara Câmara, que é responsável pela administração e suporte institucional, enquanto a professora Jucimar Vilar é responsável pela seleção dos bolsistas, acompanhamento das aulas e a aprendizagem dos alunos. Esse formato de administração está contribuindo para a concretização de uma formação qualificada para os alunos da licenciatura e aproveitamento eficaz dos alunos que integram o projeto. 

Antes de assumir a coordenação, Jussara já acompanhava o projeto e apoiava administrativamente, agora se sente honrada em assumir esse trabalho “tão importante que visa contribuir com a acessibilidade de estudantes oriundos de escolas públicas aos cursos de graduação”.

“Muitas vezes, esses estudantes não conseguiram uma boa base na sua escola de origem e têm a oportunidade de aprender mais sobre o que viram e preencherem lacunas de conhecimento. É muito bom ver a alegria deles após a aprovação em uma graduação de uma instituição pública de ensino superior, isso é algo que compensa qualquer esforço ou trabalho que tivemos ao longo do ano”, destaca.

“Passamos dois anos do cursinho com ensino remoto, tivemos muitas dificuldades, mas a gente insistiu e quando saiu o resultado do SISU na primeira chamada, tivemos 54 alunos aprovados, dos 112 que ficaram até o final das aulas. Na segunda chamada, foram mais 34 alunos aprovados”, comemora Jucimar Vilar. 

Além da aprovação dos alunos no SISU, ela se emociona com a conquista dos bolsistas, ao entrarem no mercado de trabalho. “A gente trabalha com eles o tempo todo, auxiliando nos planos de aulas e quando vê eles atuando no mercado, é uma alegria muito grande. Isso mostra que estou cumprindo meu papel como professora da UFRN”, pontua.

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